O segundo volume de CRIMINAL está a caminho, e ainda há leitores que não conhecem esta magnífica série de uma das maiores duplas de criadores de sempre Ed Brubaker e Sean Phillips, e esta é uma óptima oportunidade para re-apresentar esta série aos nossos fãs.

Existem duplas de criadores que são mais do que a mera soma das suas capacidades individuais, e que se tornam em algo que é uma unidade, uma identidade própria, e o duo Ed Brubaker e Sean Phillips é sem dúvida uma delas. Em pouco mais de uma década transformaram-se em sinónimo de história policial noir em banda desenhada, e tornaram-se na própria definição do género. Mas a sua colaboração vai muito mais longe, as suas obras são muito mais do que simples histórias policiais, e os fãs devem celebrar o facto dessa colaboração durar já há mais de uma década.

Ed Brubaker afirmou-se nos comics primariamente com obras que eram policiais, mesmo que pertencessem também a outros géneros, algumas das quais ajudaram mesmo a reconstruir a maneira como se contavam histórias de super-heróis, por exemplo. É o caso de Gotham Central (co-escrito com Greg Rucka), que segue as aventuras e desventuras dos agentes, detectives, criminosos, informadores e pura e simplesmente de toda a cidade "normal" e da esquadra que tem de viver à sombra do Batman e de outros super-heróis (que quase nem aparecem nestas histórias). A sua série seguinte foi o excepcional Sleeper, que era também um verdadeiro thriller noir, um pulp moderno que evoluía num universo de super-heróis: a história de um agente secreto que é inserido numa organização super-criminosa, e o que acontece quando a única pessoa que sabe quem ele é, o seu chefe nas Operações Especiais da agência a que pertence, fica num coma após uma tentativa de assassinato... Estas histórias serviram quase como uma espécie de “treino” para o que Criminal viria a ser, para além do facto de que Sleeper seria a sua primeira colaboração longa com Sean Phillips, a segunda metade desta dupla.

Lançada em 2006, Criminal conheceu imediatamente um enorme sucesso. Brubaker definiu um dia a série como sendo uma exploração do carácter de personagens que fizeram más escolhas, coisas terríveis, misturada com explosões de violência e crime aleatórias. E esse lado aleatório do acaso que faz mal as coisas é uma constante na série, e que a marca de certo modo como algo mais do que um simples comic policial. Brubaker viveu pessoalmente alguma dessa vida quando era adolescente, e é o primeiro a dizer que só por sorte não foi preso e se safou da vida terrível que ele descreve nos seus livros. De certa maneira, isso explica porque as personagens dele são tão credíveis, e ao mesmo tempo detestáveis, desprezíveis, mas também humanas e cheias de potencial.

Outro motivo de interesse de Criminal é poder observar a evolução de Sean Phillips como ilustrador ao longo da série. Phillips consegue levar ao auge a capacidade de “understatement”, de mostrar muito com pouco, e os leitores portugueses terão a possibilidade de acompanhar mais de uma dezena de anos de transformação do traço do artista, comprimidos em pouco mais de um ano e poucos volumes nas nossas edições, e poderão comparar também com The Fade Out, que já nos apresenta um Sean Phillips depurado, ao mesmo tempo rico nos pormenores e no ambiente, e contido nas personagens, mas capaz de comunicar uma extensa gama de emoções e pensamento através de mudanças de posição e posturas, e de expressões faciais ao mesmo subtis, mas intensas.

E assim, depois de termos já editado CRIMINAL LIVRO UM (que reúne as histórias Cobarde e Lawless), e o romance gráfico Os Meus Heróis Foram Sempre Drogados, os leitores portugueses estão prestes a descobrir a segunda fase desta série, com as histórias Os Mortos e os Moribundos e Uma Noite Má, que ajudarão a definir e a revelar mais um conjunto de personagens e eventos deste labirinto perfeito com que Ed Brubaker e Sean Phillips começaram a contar histórias diferentes, e que ao mesmo tempo partilham uma familiaridade e semelhança, histórias independentes mas em que apesar de tudo reaparecem personagens, locais, momentos desta cidade negra e criminosa em que o leitor se irá perder sem apelo nem agravo.